sábado, 28 de maio de 2011

SUBSIDIOS PARA A HISTÓRIA DA CORPORAÇÃO DE PILOTOS DA BARRA DO DOURO E PORTO ARTIFICIAL DE LEIXÕES – Episódio 179

O NAUFRÁGIO DO PAQUETE "ORANIA" NO PORTO DE LEIXÕES POR TER SIDO ABALROADO PELO PAQUETE "LOANDA"


 ORANIA / Postal oficial da Koninklijke Hollandsche Lloyd /.

O ORANIA, 142m/ 9.763tb, vindo da América do Sul com escala pelo porto de Lisboa, consignado aos agentes Orey Antunes & Cia, Lda, do Porto, aparecera à vista pelas 07h00 de 19/12/1934, e apesar do mau tempo que se fazia sentir, foi decidido dar entrada àquele paquete, dado que vinha desembarcar poucos passageiros e alguma carga, e como tal demoraria no máximo umas quatro horas. A lancha de pilotar P1 tentou, por várias vezes, fazer-se ao largo, contudo a forte maresia, cujos vagalhões se vinham desfazer em espuma entre molhes e nas praias vizinhas, galgando os dois paredões portuários, não permitia a sua saída, e às 12h00, conduzindo o piloto, saiu o rebocador MARS 2º, muito possivelmente levando a reboque a catraia P5 para manobras de abordagem, que o fez embarcar com sucesso e o ORANIA demandou o porto sem percalços, fundeando a meio porto a dois ferros, espaço exíguo, devido à aglomeração de outros 12 vapores e mais embarcações de pequeno porte e de seguida foi içado no mastro do castelo de Leça o sinal de porto encerrado.


 LOANDA / (c) Photo purchased from A. Duncan in the 60's - My own collection /.


 O paquete LOANDA, 127m/ 5.085tb, procedente do porto de Lisboa, que vinha receber carga para vários portos de Angola, sem que se previsse, e segundo consta, o seu capitão, um veterano nas suas vindas ao porto de Leixões, entendera que ele tinha prioridade sobre o ORANIA, por ter chegado anteriormente, e por isso não deveria ficar ao largo, só que demandou o porto sem a presença física de um piloto da barra, e ainda para mais com sinal negativo, já acima referido, que estranhamente parece não ter sido visível de bordo.
A bordo do vapor Norueguês BJORNOY, 80m/ 1.493tb, fundeado na covada do molhe Sul, que de véspera estivera à barra do Douro e devido à forte maresia não entrara, tendo-se ido abrigar à bacia do porto de Leixões, juntamente com mais 10 vapores, encontrava-se o piloto José Fernandes Amaro Júnior, meu pai, que permanecia a bordo, para orientar qualquer manobra de emergência, que viesse a ser necessária devido ao mau tempo, assim como os seus outros colegas embarcados nos outros vapores, testemunhara o naufrágio, e prevendo o desastre que se avizinhava, o meu pai chamou o capitão à ponte, e disse-lhe, o LOANDA vem com demasiado andamento e embalado pela ondulação não vai conseguir estancar, o espaço de manobra é curto e de certeza a sua proa vai entrar pelo costado, a meia nau, zona de caldeiras e máquina, do ORANIA, e vai ser uma grande tragédia, jamais vista neste porto e acrescentou, que ele mandasse preparar as baleeiras para prestar auxilio aos muitos náufragos, 158 tripulantes, 121 passageiros, e ainda um razoável número de pessoal de terra, e de regresso à ponte o capitão apareceu de máquina fotográfica, começando a disparar a objectiva.


O capitão Laurens Maars, do ORANIA, prevendo o embate, dá ordem para que todos a bordo se segurassem, enquanto o LOANDA, expelindo imenso fumo pela chaminé, vê-se diante do ORANIA, e sem espaço de manobra, de marcha toda força à ré, sem conseguir deter-se, larga os dois ferros, e embate estrondosamente no ORANIA por ré da ponte de comando, abrindo-lhe uma enorme brecha desde a coberta superior até a linha de água, por onde começa a entrar água a rodos, ao mesmo tempo que o seu capitão, conscientemente manda descarregar as caldeiras, a fim de evitar uma grande explosão. De bordo ergue-se um coro de gritos de pavor, nomeadamente dos passageiros, que procuravam socorro, apesar da tripulação se mostrar relativamente calma.

http://www.archeosousmarine.net/orania.html (Sequência fotográfica obtida pela objectiva do tripulante Kurt Baltschun, do vapor Alemão CEUTA e publicada na l'Illustration nº 4801 de 09/03/1935).

O ORANIA começa a adornar a bombordo, e em pouco tempo acaba de ficar completamente tombado e semi submerso. Todo o pessoal a bordo é salvo pelos meios de salvamento do vapor, por baleeiras de outros navios e por embarcações portuárias, incluindo o salva-vidas do ISN.
Em face da situação, o LOANDA foi intimado a abandonar o porto, assim como os vapores BJORNOY, OTTINGE, KRONOS, GONÇALO VELHO, MINA e ODYSSEUS, que se fizeram ao largo, tendo os respectivos pilotos desembarcado. Os vapores IBO, PADUA, CEUTA e MARIVALDES continuaram fundeados na Bacia, com pilotos embarcados.
Chegada a notícia do naufrágio à cidade do Porto e arredores, os cais de Leixões encheram-se de populares, e nos dias seguintes a romagem de curiosos continuava. Nas praias das proximidades do porto de Leixões, a guarda-fiscal coadjuvada pela PSP procedia a uma rigorosa vigilância, a fim de impedir que fossem "pilhados" por estranhos aos serviços marítimos, os materiais e restos de bagagens que o mar se tinha encarregado de arrebatar do interior do paquete. Também como é usual várias companhias de salvamento começaram a afluir ao porto de Leixões, dentre as quais a A/S Em. Svitzer's Bjerg, de Copenhaga, com o seu salvadego VALKYRIEN, que passado alguns dias tentou deslocar o ORANIA para área portuária que não obstruísse o movimento marítimo.




O destroço do ORANIA permaneceu por muito tempo, e por duas vezes flutuou e outras duas vezes se afundou, embora tivesse sido retirado do local do acidente, e diz-se que só não foi recuperado, devido a interesses alheios às autoridades marítimo-portuárias e ao próprio armador, a Koninklijke Hollandsche Lloyd (Mala Real Holandesa), de Amesterdão, que em 1935 abandonou o serviço de passageiros devido a um litigio com o porto de Leixões, tendo os seus outros dois paquetes, o FLANDRIA e o ZEELANDIA, e mesmo os navios de carga deixado de escalar portos Portugueses receando arresto dos mesmos, só regressando a Leixões, com um navio já na década de 70. Ao que parece o navio dava mais dinheiro no fundo, com a tentativa de recuperação, que a flutuar. Até que alguém disse basta! Daí que veio a ordem para o demolir.
Nos trabalhos de tentativa de reflutuação do ORANIA, e da sua deslocação para área que não obstruísse o movimento portuário, o que ocorreu por várias vezes, tomaram parte os salvadegos CABO ESPICHEL e CABO SARDÃO, do porto de Lisboa (AGPL).
A companhia Koninklijke Hollandsche Lloyd (Mala Real Holandesa) foi fundada em 1899, passando a dedicar-se ao transporte de gado desde América do Sul para a Europa. O comércio do gado terminou em 1903, quando o Governo Britânico proibiu a importação de gado vivo devido a um surto epidémico na Argentina e em 1906 a companhia voltou-se para o transporte de passageiros e emigrantes a partir do porto de Amesterdão com escalas nos portos de Boulogne-sur-Mer, Plymouth, Corunha, Lisboa, Las Palnas, Pernambuco, Baía, Rio de Janeiro, Santos, Montevideo e Buenos Aires, e mais tarde passou também a utilizar o porto de Leixões. Entre 1917 e 1919 a companhia também fez algumas escalas em Nova Iorque. O serviço de passageiros cessara em 1935 devido aos seus navios deixaram de escalar os portos Portugueses de Leixões e Lisboa, pelas razões já acima relatadas, portos tradicionalmente de emigração compensadora para o Brasil e Rio da Prata, mas em contra partida continuou e desenvolveu o serviço de carga para os portos do Brasil e Rio da Prata, e em 1981 foi incorporada no grupo Nedlloyd, através da KNSM.
ORANIA – 142m/ 9.763tb/ 2 hélices/ 14,5nós/ passageiros 154 1ª classe, 68 2ª classe, 120 intermediária, 850 3ª classe/ 02/1922 entregue pelo estaleiro Workman, Clark & Co. Ltd., Belfast, à Koninklijke Hollandsche Lloyd (Mala Real Holandesa), Amesterdão; 1922 iniciou a sua viagem inaugural ao Brasil e Rio da Prata, escalando Las Palmas, Pernambuco, Baía, Rio de Janeiro, Santos, Montevideo e Buenos Aires. Gémeo FLANDRIA.
LOANDA – 127m/ 5.085tb/ 10,5 nós/ 12/1900 entregue por Bremer Vulkan Werft, Vegesack, como WURZBURG à Nordeutscher Lloyd, Bremen, que o empregou no serviço de passageiros e carga para a costa leste da América do Sul; 03/08/1914 WURZBURG, internado no porto do Mindelo, Ilha de São Vicente, Cabo Verde, devido ao eclodir da 1ª guerra mundial; 1916 WURZBURG, requisitado e tomado pelo governo de Portugal; 1916 SÃO VICENTE, TME-Transportes Maritimos do Estado, EP, Lisboa; 1916 SÃO VICENTE, fretado pela Furness Withy; 1918 SÃO VICENTE, subfretado pelo governo de França como transporte de tropas; 1920 SÃO VICENTE, reentregue ao TME-Transportes Marítimos do Estado, EP, Lisboa;1925 LOANDA, Companhia Colonial de Navegação, Loanda; 26/08/1938 chegava ao porto de Genova para demolição.
BJORNOY – 82m/ 1.493tb/ 12 nós; 09/04/1908 entregue por Nylands Verksted, Oslo, como JUAN à D/S A/S Vestheim, Oslo; 1933 JUAN, Harald Olsen, Haugesund; 1934 BJORNOY, A/S D/S Bjornoy, Bergen; 1936 BJORNOY, A/S Trygg, Haugesund; 1937 REINA, Scotra Corp., Panamá; 1939 CASTILLO OLMEDO, Governo Espanhol, Cadiz; 1942 CASTILLO OLMEDO, Empresa Nacional Elcano de la Marina Mercante, Cadiz; 1944/46 CASTILLO OLMEDO, convertido em navio do cabo submarino; 06/1969 chegava a Barcelona para desmantelamento por SA Calado.

Relativamente aos navios demandarem o porto de Leixões sem a presença fisica de piloto da barra ou ao sinal, posso dizer, porque assisti a muitos casos, que até â década de 50, houveram navios que acabados de chegar ou estivessem fundeados ao largo, e afim de se abrigarem do mau tempo e mar que estava deteriorar-se, iam-se aproximando dos molhes e mais tarde do farol do Esporão e aí vinham debaixo de mar, riscando perigosamente na vaga, e raramente abortavam a manobra de entrada, e quando os pilotos, no seu posto de vigia, o antigo torreão do castelo de Leça, davam por ela, e corriam para a lancha de pilotar, no cais do Marégrafo, já o navio estava dentro da bacia, salvo se houvesse sinal de porto encerrado.
Fontes: José Fernandes Amaro Júnior, Lloyd´s Register of Shipping, Imprensa diária.
(continua)
Rui Amaro

ATENÇÃO: Se houver alguém que se ache com direitos sobre as imagens postadas neste blogue, deve-o comunicar de imediato. a fim da(s) mesma(s) ser(em) retirada(s), o que será uma pena, contudo rogo a sua compreensão e autorização para a continuação da(s) mesma(s)neste Blogue, o que muito se agradece.
ATTENTION. If there is anyone who thinks they have “copyrights” of any images/photos posted on this blog, should contact me immediately, in order I remove them, but will be sadness. However I appeal for your comprehension and authorizing the continuation of the same on this Blog, which will be very much appreciated.

Sem comentários: